Por Nuno Clode | Assistente Hospitalar Sénior de Obstetrícia e Ginecologia, Hospital CUF Descobertas
A associação da endometriose, cuja prevalência ronda os 5% na população de idade fértil, com desfechos maternos adversos não se encontra estabelecida embora haja alguma evidencia que a grávida com esta doença tenha uma prevalência aumentada de diabetes gestacional e parto pré-termo.
Este estudo, que analisou retrospetivamente uma coorte de cerca de 2,4 milhões de gestações, entre 1989-2019, no Canadá, pretendeu esclarecer se havia alguma relação entre endometriose e morbilidade materna grave (MMG) – pré-eclampsia/eclâmpsia, hemorragia pós-parto, tromboembolismo, sépsis, complicações cirúrgicas, complicações cardiovasculares, admissão a cuidados intensivos, etc.. – durante a gestação, parto e pós-parto (até ao 42ºd).
A prevalência de MMG foi maior na população de gravidas com endometriose (46,2/1000 gestações vs 30,7/1000; RR 1,4, 95%CI 1,60-2,07) sendo o risco maior nas grávidas com endometriose activa (RR 1,93, 95% CI 1,76-2,11); na avaliação com outras variáveis maternas, a endometriose mostrou ser uma factor de risco independente para MMG.
Na discussão dos resultados são sugeridas explicações para as observações registadas cujo valor se apoia na extensa amostra apesar das limitações associadas a um estudo retrospectivo e num tão longo intervalo temporal.
Para a prática clinica, a reter deste trabalho a ideia de que a gestante com história de endometriose apresenta um risco maior de desfechos adversos necessitando uma vigilância mais apertada na gravidez, parto e pós parto.
Por Ana Luísa Areia | Serviço de Obstetrícia, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra; Universidade de Coimbra • Faculdade de Medicina
Os objetivos desta revisão foram examinar os melhores estudos atuais relativamente à eficácia da progesterona vaginal (VP) para prevenir o parto pré-termo (PTB) e melhorar os resultados perinatais em vários subgrupos de mulheres de alto risco; e fornecer recomendações clínicas para estas mulheres. Os dados analisados incluíram ensaios controlados aleatorizados, revisões sistemáticas e meta-análises. De realçar nesta revisão o número elevado de estudos incluídos, os critérios estritos de inclusão e a sugestão de guidelines diferentes das utilizadas atualmente.
A análise minuciosa de toda a literatura existente indica que a VP reduz o risco de PTB e melhora os resultados perinatais em gestações de feto único com colo curto (≤25 mm), com e sem história de PTB espontâneo anterior. A VP parece promissora para reduzir o risco de PTB em gestações gemelares com colo do útero curto (≤25mm) e em gestações de feto único concebidas por reprodução medicamente assistida, sendo, no entanto, necessária mais investigação. Pelo contrário, não há provas convincentes que apoiem a prescrição de VP para prevenir o PTB em gestações de feto único com base unicamente na história de PTB prévio.
Da mesma forma, a evidência científica demonstrou que a VP não impede o PTB nem melhora os resultados perinatais em gestações múltiplas não selecionadas e em gestações de feto único com uma história de PTB espontâneo e um comprimento cervical >25 mm. Ainda, não é recomendada a utilização de VP para prevenir o PTB em gestações multi-fetais de ordem tripla ou superior, gestações de feto único com teste de fibronectina fetal positivo, nem em mulheres com anomalias uterinas congénitas ou leiomiomas uterinos. Em conclusão, os autores indicam que a VP deve apenas ser recomendada em gestações de feto único com colo curto (≤25 mm), independentemente da história de PTB espontâneo.
Por Inês Nunes | Assistente Hospitalar de Ginecologia e Obstetrícia, Centro Materno-Infantil do Norte – CMIN, Centro Hospitalar e Universitário do Porto – CHUPorto; Professora Auxiliar Convidada do ICBAS – School of Medicine and Biomedical Sciences, Universidade do Porto, Porto.
A variabilidade da frequência cardíaca fetal (FCF) é uma característica importante para a correta interpretação da cardiotocografia (CTG), sendo principalmente determinada pelo sistema nervoso autónomo. De acordo com a evidência atual, a variabilidade aumentada poderá refletir instabilidade autonómica, resultante de uma diminuição da oxigenação fetal.
Neste estudo de coorte prospetivo, decorrido em dois centros, foram incluídas 4394 grávidas de termo, com CTG contínuo até ao parto e com dados de pH da artéria umbilical. Considerou-se os 60 minutos antes do parto e a variabilidade aumentada (superior a 25bpm), com duração mínima de 1 minuto, e avaliou-se a sua associação com acidose neonatal – pH da artéria umbilical <7.10. Desta população, 177 (4%) apresentaram variabilidade aumentada da FCF (duração mediana de 2 minutos; concordância interobservador elevada – Kappa 0.81). A acidose neonatal ocorreu em 6% dos RN (265/4394) – 15.3% em RN com variabilidade aumentada e 5.6% em RN sem variabilidade aumentada (RR 2.70, IC95% 1.82-4.02). Na análise multivariada, a variabilidade aumentada associou-se significativamente a acidose neonatal (aRR 2.30, IC95% 1.53-3.44). Na análise de subgrupos, a associação manteve-se significativa para CTGs de categoria I (62/2119 RN – 2.9% variabilidade aumentada para 6.5% de acidose neonatal, (aRR 5.48, IC95% 1.88-15.96)) e II – NICHD (103/1746 RN – 5.9% variabilidade aumentada para 18.5% de acidose neonatal, (aRR 2.29, IC95% 1.40-3.74).
Aspetos positivos – coorte prospetivo, classificação NICHD e baixa variabilidade inter-observador (padrão de FCF fácil de identificar), análise por subgrupos de padrões de FCF.
Limitações – estudo observacional, duração do padrão de variabilidade aumentada não foi avaliada, exclusão de partos por cesariana.
Ainda assim, este é o primeiro estudo de coorte a avaliar a variabilidade aumentada, tendo encontrado uma associação significativa deste padrão de FCF a um risco duas vezes maior de acidose neonatal.
Por Sofia Bessa Monteiro | Assistente Hospitalar de Ginecologia/Obstetrícia – Serviço de Obstetrícia/Centro Hospitalar de S João
O parto pré-termo (PPT) é um dos principais problemas de Saúde Pública. Estima-se um risco de recorrência de 30%, sendo que o aconselhamento destas grávidas é feito essencialmente baseado em critérios clínicos como o tipo de parto e idade gestacional (IG).
O exame anatomo-patológico (AP) da placenta é frequentemente realizado após um PPT, não podendo os resultados influenciar o desfecho da gravidez em causa – mas poderão contribuir para um melhor aconselhamento quanto ao risco de recorrência?
Este foi um estudo retrospectivo que incluiu grávidas com 2 ou mais partos, com o caso-índice sendo um parto < 37 semanas com a placenta enviada para exame AP, no período de janeiro 2009 a março 2018, num total de 924 pares de partos. Os achados AP foram divididos em 4 categorias, de acordo com mecanismos patofisiológicos: inflamação aguda (AI), inflamação crónica (CI), má perfusão vascular fetal (FVM) e má-perfusão vascular materna (MVM).
Os resultados revelaram que apenas a CI de alto grau se associava de forma independente ao risco de recorrência de PPT (risco relativo 1.37 com IC 95% 1.03-1.81). Na análise estratificada para IG, a MVM de baixo grau estava associada a recorrência apenas nos casos de PPT precoce ou moderado (< 34 semanas). Nenhuma associação foi encontrada entre risco de PPT e tipo histológico, nos PPT espontâneos.
Apesar de se tratar dum estudo retrospectivo e podendo existir viés na seleção dos casos que foram enviados para AP, este estudo incluiu um grande número de participantes e exames AP feitos por anatomo-patologistas perinatais.
Atualmente não existe uma estratégia única e ideal para prevenção da recorrência de PPT, provavelmente porque existem diferentes etiologias para uma mesma apresentação clínica final. O exame AP da placenta poderá revelar subgrupos que permitam desenhar terapêuticas adaptadas aos diversos mecanismos na origem do complexo parto pré-termo.
Por Susana Santo | Assistente Hospitalar Graduada de Obstetrícia e Ginecologia – Serviço de Obstetrícia/ Hospital Santa Maria – CHLN
A “cabeça fetal impactada” é uma complicação obstétrica que está associada a morbilidade materna e neonatal significativas. Apesar de a sua definição não ser consensual, todos os obstetras já foram confrontados com uma cesariana em que a cabeça fetal está numa posição baixa e fixa na pelve materna, revelando-se a sua extração muito difícil. Do ponto vista fetal, a “cabeça fetal impactada” pode associar-se à ocorrência de fratura do crânio, hemorragia intracraniana, lesão nervosa, encefalopatia hipóxico-isquémica e raramente a morte; a morbilidade materna inclui as lacerações uterinas, a lesão do trato urinário, a hemorragia pós-parto e eventualmente necessidade de realização de histerectomia.
A “cabeça fetal impactada” pode complicar 5% das cesarianas, sendo mais frequente nas cesarianas realizadas no segundo estadio do trabalho de parto.
Existem diversas técnicas para a resolução desta condição que incluem: tentativa de flexão e elevação do polo cefálico, elevação da cabeça fetal por via vaginal, incisão uterina em T ou em J, extração pélvica reversa, técnica de Patwardhan, utilização de tocólise, entre outras.
O reconhecimento da “cabeça fetal impactada” como uma emergência obstétrica é muito relevante. Primeiro porque a sua identificação não traduz necessariamente uma incapacidade pessoal na extração fetal na cesariana, mas sim a necessidade de pedir ajuda e iniciar um conjunto de manobras com vista à sua resolução.
O facto de ser uma condição imprevisível condiciona que o treino em situações clínicas reais seja improvável e pouco sistematizado.
O estudo publicado valida um novo modelo para treino desta emergência obstétrica, tendo-se revelado realístico, útil para a formação obstétrica e permitindo a distinção entre obstetras mais ou menos experientes. Este modelo é mais uma ferramenta a juntar a todos os outros simuladores que nos dias de hoje permitem o treino individual ou de equipas em emergências obstétricas.
Por Ana Paula Machado | Assistente Hospitalar Graduada em Ginecologia e Obstetrícia – Centro Hospitalar Universitário S. João, Porto
A diabetes gestacional (DG) e as doenças hipertensivas da gravidez (DHG) são das complicações mais frequentes da gravidez, ocorrendo em 7% e 10% das gestações, respetivamente. Estudos sugerem que, na população geral, a prática de exercício físico é uma estratégia eficaz na prevenção e tratamento da diabetes mellitus e hipertensão arterial pela redução dos mecanismos inflamatórios que acarreta. No entanto, a evidência científica não é consistente quanto à sua efetividade na evicção destas patologias na gravidez.
O objetivo deste estudo foi avaliar o real impacto de programas de exercício físico sobre a DG e DHG. Para esse efeito foi realizada uma revisão em guarda-chuva de 21 revisões sistemáticas e meta-análises e 54 ensaios randomizados, englobando 10485 grávidas no grupo de intervenção e 11192 no grupo de controlo. Foram efetuadas análises de subgrupo relativamente ao Índice de Massa Corporal (IMC), trimestre de início da intervenção, duração da sessão e supervisão durante o exercício. Verificou-se uma redução significativa da incidência de DG de 39% (OR: 0,61; IC 95% 0,51-0,74), particularmente se intervenção iniciada no primeiro trimestre, supervisionada e de intensidade ligeira-moderada. Relativamente às DHG, a redução da incidência de hipertensão gestacional (HG) foi de 47% (OR: 0,53; IC 95% 0,40-0,71), mais marcada se sessões com duração superior a 45minutos, supervisionadas, iniciadas no primeiro/segundo trimestres e com intensidade ligeira-moderada ou moderada. Quanto à pré-eclâmpsia, o impacto na redução da incidência foi apenas verificado se intervenção iniciada no primeiro trimestre da gravidez. A efetividade do exercício não foi constatada nas situações de IMC elevado previamente à gravidez.
Os autores consideram a possibilidade de retirar recomendações concretas deste artigo, baseadas no impacto do exercício físico na incidência de DG e HG em grávidas sem excesso de peso/obesidade, particularmente relevante em programas iniciados no primeiro trimestre, supervisionados, superiores a 45minutos e de intensidade ligeira-moderada.
Por Cristina Nogueira Silva | Assistente Hospitalar de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital de Braga; Professora Associada da Escola de Medicina da Universidade do Minho; Investigadora do ICVS e do Laboratório Associado ICVS/3B’s
Este trabalho teve como objetivo responder à controvérsia quanto ao momento ideal para a realização de uma cesariana eletiva (CE) em mulheres com ≥ 2 cesarianas anteriores, avaliando os riscos maternos e neonatais associados com a cesariana em diferentes idades gestacionais de termo, comparativamente com a abordagem expectante.
Trata-se de um estudo retrospetivo (abril/2012 a março/2019), de coorte (n= 26.552), de base populacional (Ontário-Canadá), incluindo todas as mulheres com ≥ 2 cesarianas e gestação unifetal de termo. A coorte foi dividida em 3 grupos, um para cada semana gestacional (37, 38 e 39 semanas) e comparados os desfechos adversos (maternos e neonatais) entre CE e os casos abordados de forma expectante nessa semana.
Não se verificaram diferenças significativas quanto a desfechos adversos maternos composto entre CE às 37 e 38 semanas e o grupo expectante, quando os resultados foram ajustados para potenciais fatores confundidores. Contudo, CE às 39 semanas associou-se a menor risco materno do que o grupo expectante (OR ajustado 0,51; IC 95%: 0,29-0,91). Relativamente aos desfechos neonatais, CE às 37 semanas aumentou significativamente os desfechos adversos (ORa 1,68; IC 95%: 1,39-2,01) comparativamente com a abordagem expectante. Porém, não se verificaram diferenças significativas nos desfechos neonatais se CE às 38 ou 39 semanas, se ajustado para fatores confundidores. O risco de cesariana não planeada (de urgência) foi de 6,5% antes das 38 semanas, 21,7% antes das 39 e 32,6% antes das 40 semanas.
De salientar a dimensão da amostra, o estudo multicêntrico e a realização de ajuste para fatores confundidores como pontos fortes deste trabalho. Como limitação saliento a incapacidade para avaliar desfechos raros, como morte materna ou neonatal.
Portanto, de acordo com os resultados deste estudo, na ausência de indicações para parto mais precoce, nas mulheres com ≥ 2 cesarianas, programar a cesariana para entre as 38+0 e as 38+6 semanas de gestação representa o balanço ideal entre os riscos maternos e neonatais, minimizando a probabilidade de uma cesariana não planeada.
Por Inês Sarmento Gonçalves | Assistente Hospitalar de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Pedro Hispano; Assistente Convidada da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto
Este artigo aborda um assunto controverso e atual ao pretender avaliar a redução do risco de parto pré-termo (PPT) na gestação gemelar com recurso à ciclorrafia às 18-26 semanas de gestação quando comprimento cervical < 25mm.
É um estudo caso-controlo, retrospetivo (dezembro 2013 a agosto 2021, no Hospital Universitário de Zhejiang, China), que compara 2 grupos de gestações gemelares com comprimento cervical < 25mm (n=90): um grupo de tratamento (n=45) que realizou ciclorrafia (além de antibioterapia e tocólise) e um grupo de controlo (n=45) sob atitude expectante, ajustados para o comprimento cervical medido por ecografia endovaginal ao diagnóstico, idade gestacional ao diagnóstico e idade materna.
O grupo submetido a ciclorrafia apresentou uma idade gestacional no parto significamente superior ao controlo (33.11±3.16 vs 30.22±4.12 semanas), com taxas de PPT espontâneo (<28, <32, <34 e < 36 semanas), desfechos perinatais e neonatais adversos (mortalidade perinatal, cuidados intensivos neonatais) significativamente inferiores. Foi realizada uma subanálise destes desfechos em 2 subgrupos de comprimento cervical: < 15mm e 15-24mm, com ajuste das amostras para idade materna, IMC, FIV, antecedentes de cirurgia cervical, histeroscopia, cesariana anterior, PPT anterior, leucograma e PCR. Houve melhores desfechos perinatais e neonatais nos 2 subgrupos submetidos a ciclorrafia, com redução de PPT < 36 semanas no subgrupo com comprimento cervical 15-24mm e de PPT <32 e <34 semanas no subgrupo com comprimento cervical < 15mm.
Apesar da reduzida amostra e do desenho retrospetivo do estudo foram tidos em conta fatores confundidores e ajustadas as amostras. A idade gestacional ao nascimento foi significamente superior no grupo submetido a ciclorrafia e houve uma redução significativa das taxas de parto pré-termo nos 2 subgrupos com diferentes comprimentos cervicais ecográficos.
É cada vez mais pertinente equacionar-se alternativas para reduzir a taxa de parto pré-termo nas gestações gemelares, cada vez mais prevalentes na atualidade obstétrica.
Por Sofia Franco | Assistente Hospitalar Graduado de Ginecologia-Obstetrícia / Serviço de Obstetrícia do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra
Este artigo de opinião tem por objetivo alertar para a necessidade de implementar um programa de rastreio de vasa prévia (VP) no Reino Unido, contrariamente à Guideline atual do RCOG (Green-Top Guideline 27b, de 2018) que não é a favor do mesmo. Atualmente, as recomendações não são consensuais existindo abordagens diferentes consoante o país. Nos Estados Unidos, no Canadá e na Austrália/Nova Zelândia as recomendações são para o rastreio de VP nas situações de maior risco, como seja a placenta baixa/prévia.
Sabemos que num programa de rastreio a maioria dos utentes não terão doença, mas a mesma tem relevância suficiente, como morbimortalidade perinatal, para ser pesquisada. A prevalência de VP parece ser superior à de anomalias congénitas, com programas de rastreio pré-natal já implementados e de indiscutível importância.
Sabe-se que o rastreio pré-natal por ecografia tranvaginal associando estudo Doppler cor demonstrou taxas de deteção superiores a 90% e raros falsos positivos ou negativos, parecendo uma estratégia com pouco custo adicional, quando implementada em simultâneo com a ecografia de rotina do 2.º trimestre. O diagnóstico do local de inserção placentária do cordão umbilical na placenta, adicionando a avaliação Doppler da região supra cervical, permitiria um rastreio universal de VP. Esta metodologia combinada com posterior uso de sonda transvaginal com Doppler cor, nas situações de placenta baixa ou outras situações de alto risco – rastreio dirigido, é custo-efetivo no rastreio pré-natal de VP.
Como forma de evitar iatrogenia e sabendo que o diagnóstico de VP implica parto por cesariana, antes do trabalho de parto ou da rotura de membranas, está recomendada a reavaliação no 3.º trimestre por ecografia tranvaginal, associando estudo Doppler cor.
A possibilidade de planear um parto por cesariana, confirmado o diagnóstico pré-natal de VP, reduz os resultados perinatais adversos, a morte fetal ou neonatal. Este rastreio, adequadamente implementado, faz a diferencia entre a sobrevivência ou a morte.
Por Ana Catarina Massa | Assistente Hospitalar de Ginecologia / Obstetrícia, Hospital CUF Descobertas, Lisboa
A cabeça fetal impactada pode complicar até 16% das cesarianas no 2º estadio do trabalho de parto sendo mais frequente após uma tentativa de parto vaginal instrumentado. A cabeça fetal fica fixa ou impactada na pélvis deixando de existir espaço entre os ossos pélvicos, os músculos pélvicos e a cabeça fetal e representa uma emergência obstétrica. Associa-se morbilidade materna e neonatal: extensão da histerotomia, lesão vesical, hemorragia pós parto com necessidade de transfusão sanguínea, baixo Índice de Apgar e admissão nos Cuidados Intensivos Neonatais.
Diversas técnicas foram desenvolvidas para resolver esta condição como a elevação da cabeça fetal por via vaginal, extração pélvica reversa, método de proclive materno, técnica de Patwardhan, o uso de tocolíticos e dispositivos como fetal pillow ou tubo de Tydeman.
Nesta revisão sistemática foram incluídos 16 estudos, representando um total de 3344 mulheres. Treze desses estudos compararam a elevação da cabeça fetal por via vaginal com a extração pélvica reversa demonstrando maior morbildade materna e neonatal para a técnica de elevação da cabeça fetal por via vaginal. Os restantes 3 estudos mostraram resultados similares entre as técnicas de elevação da cabeça fetal por via vaginal e de Patwardhan.
Sendo uma condição difícil de definir, existe uma grande heterogeneidade dos critérios clínicos dos diversos estudos publicados e com amostras reduzidas. No entanto, os autores deste estudo utilizaram critérios rigorosos para a seleção dos estudos incluídos.
Embora ainda esteja por definir qual a melhor técnica para a resolução da cabeça fetal impactada no parto por cesariana e se o uso sequencial dos diversos métodos poderá trazer melhores resultados, esta revisão veio contribuir para o melhor conhecimento desta entidade.
Por Joana Barros | Assistente Hospitalar de Obstetrícia e Ginecologia – Serviço de Obstetrícia/Hospital da Luz – Lisboa
O rastreio de restrição de crescimento fetal (RCF) no 3º trimestre da gravidez é fundamental em todas as gestações, incluindo as que não apresentam risco acrescido, sendo a avaliação ecográfica o método mais preciso para este diagnóstico. Em Portugal, de acordo com o Programa Nacional para a Vigilância da Gravidez de baixo Risco (DGS 2015) está preconizada a realização de uma avaliação ecográfica no 3º trimestre, entre as 30 e as 33 semanas de gestação. Contudo, estudos anteriormente publicados mostraram que a acuidade diagnóstica da restrição de crescimento fetal é maior se a avaliação ecográfica for realizada às 36 semanas em vez de 32 semanas de gestação.
O objetivo deste estudo aleatorizado foi comparar a precisão diagnóstica da avaliação ecográfica realizada às 35 – 37 semanas de gestação no diagnóstico de RCF e o impacto da realização de uma avaliação ecográfica às 30-33 semanas versus 30 – 33 e 35 – 37 semanas de gestação nos desfechos perinatais.
Os resultados deste estudo mostraram que o grupo que realizou uma avaliação ecográfica entre as 35 – 37 semanas de gestação obteve uma precisão de diagnóstico de restrição de crescimento fetal de 94% e associou-se a melhores desfechos perinatais. É importante salientar que este estudo incidiu numa população de gestações de baixo risco, sem patologia materna associada, o que torna o diagnóstico de RCF mais preponderante na abordagem destas gestações, que de outra forma manteriam a sua vigilância habitual.
Este estudo vem enfatizar a necessidade de discussão sobre o momento em que deve ser realizada a avaliação ecográfica no 3º trimestre, mostrando que provavelmente será mais proveitoso adiar esta avaliação para as 35 – 37 semanas uma vez que a precisão diagnóstica de RCF é maior, bem como a correlação entre a estimativa de peso fetal e os percentis do peso ao nascer.
Por Iolanda Ferreira | Assistente Hospitalar de Ginecologia e Obstetrícia, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra/ Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra
Este estudo analisou a relação custo-eficácia da realização de ecografia do 1º trimestre previamente à pesquisa de aneuploidias por cell-free DNA (cfDNA) em comparação com a pesquisa isolada de cfDNA no 1º trimestre. Foi construído um modelo analítico de decisão para comparar as duas estratégias de rastreio em 400.000 grávidas com idade materna avançada nos EUA. A principal medida de resultado foi a relação custo-eficácia incremental (RCEI) em termos de custo por ano de vida ajustado à qualidade ganho (QALY).
O estudo revelou que realizar ecografia antes de cfDNA foi mais rentável do que a pesquisa isolada de cfDNA, com um ICER de 12.588 USD e um benefício monetário líquido mais elevado (24.241 vs 20.466). Esta estratégia revelou-se inicialmente mais dispendiosa em 544 USD. No entanto, foi também mais eficaz (em 0,04 QALY), resultando numa estratégia globalmente mais rentável.
Este estudo destaca-se por ser o primeiro a avaliar a relação custo-eficácia da ecografia antes do rastreio cfDNA. O modelo analítico de decisão considera múltiplos cenários clínicos e trade-offs, tornando os resultados generalizáveis para a população obstétrica dos EUA. Como pontos fracos destaca-se a provável mudança da relação custo-benefício à medida que o cfDNA se torna menos dispendioso; e a incapacidade do modelo em captar todas as complexidades da prática clínica. As estimativas de risco também utilizaram estudos de populações de alto risco, podendo limitar a generalização dos resultados à população obstétrica geral.
Em conclusão, a ecografia do 1º trimestre previamente a pesquisa de cfDNA é uma estratégia mais rentável para o rastreio não invasivo da aneuploidia pré-natal em comparação com cfDNA isoladamente. Estes resultados podem ser utilizados para informar decisões políticas relacionadas com o rastreio pré-natal assim como fornecer orientações valiosas aos prestadores de cuidados de saúde.
Por Sofia Pina Rodrigues | Assistente Hospitalar de Ginecologia e Obstetrícia – Serviço de Obstetrícia – Centro Hospitalar Universitário de São João
A infeção por Citomegalovírus (CMV) é a infeção congénita mais frequente (0,2-2,2%), sendo a principal causa não genética de surdez neurosensorial (1/3 dos casos). O risco de transmissão vertical do CMV após infeção primária na gravidez é 40%, ocorre através da placenta, replicando-se o vírus no epitélio tubular renal fetal e sendo o DNA viral detetado no líquido amniótico se o feto estiver infetado.
O objetivo deste estudo é comparar a incidência de lesão fetal e sequelas a longo prazo dos recém-nascidos de grávidas com infeção por CMV e resultado da amniocentese positivo versus resultado negativo.
Trata-se de uma metanálise de estudos observacionais (7 estudos, n=767) de grávidas com infeção por CMV (até 12 semanas pré-concepção e durante a gravidez) submetidas a amniocentese, cujos resultados foram reportados, assim como os desfechos dos recém-nascidos. Os desfechos primários foram as taxas de sintomas graves ao nascimento (sintomas neurológicos ou envolvimento multiorgânico) e de perda auditiva neurosensorial grave (SNHL) e/ou comprometimento do neurodesenvolvimento. O desfecho secundário foi a taxa de interrupção médica da gravidez (IMG) consequente a achados patológicos associados a esta infeção, em ecografia ou ressonância magnética.
A taxa combinada de desfechos primários nos casos com resultado de amniocentese negativo foi de 0%, contra 22% de sintomas graves e 14% de SNHL nos casos com resultado positivo. 0% de IMG nos casos de resultado de amniocentese negativo, versus 20% nos casos com resultado positivo. Houve 8% de falsos negativos da amniocentese (recém-nascidos com resultado de amniocentese negativo e resultado na urina positivo). Foi realizada uma análise de subgrupo de infeção primária por CMV com resultados sobreponíveis.
Relativamente à infeção congénita por CMV, um resultado negativo na amniocentese assegura a ausência de lesões fetais e sequelas a longo prazo decorrentes desta infeção, mesmo que a transmissão tenha ocorrido posteriormente.
Por Luísa Pinto | Assistente Hospitalar Graduada Sénior de Obstetrícia e Ginecologia / CHULN
O polihidrâmnios (PH) pode resultar de múltiplas causas como malformações fetais, diabetes gestacional ou isoimunização Rh. Contudo, em cerca de 50% dos casos, este achado é idiopático. A associação entre o polihidrâmnios idiopático e desfechos obstétricos adversos tem sido alvo de controvérsia.
Esta revisão sistemática e meta-análise incluiu 12 estudos prospetivos e retrospetivos, num total de 2392 grávidas com PH e 160135 controlos.
O desfecho primário – morte fetal – foi superior no grupo com PH relativamente ao grupo controlo (OR, 7,64 (95% CI 2.5-23.38). Quanto aos desfechos secundários, verficou-se maior risco de morte neonatal (OR, 8,68 (95% CI, 2,91-25,87), de admissão na UCIN (OR, 1,94 (95% CI, 1,45-2,59), de IA ao 5ºmin< 7 (OR 2,21 (95% CI, 1,34-3,62) e de taxa de cesarianas (OR 2,31 (95% CI, 1,79-2,99) no grupo com PH.
Assim, e apesar das suas limitações – inclusão de estudos com amostras de diferentes dimensões e com metodologias distintas, caráter retrospetivo da maioria dos estudos incluídos, diferentes definições de polihidrâmnios, variabilidade inter e intra observador na quantificação do líquido amniótico e não definição da gravidade do PH (ligeiro, moderado ou grave), esta meta-análise põe em causa a recomendação da “Society for Maternal-Fetal Medicine”, que desaconselha uma vigilância pré-natal particular nas grávidas com PH idiopático ligeiro e deve também questionar-nos, até que surjam estudos com evidência mais robusta, sobre a necessidade de uma vigilâcia fetal mais apertada ou da interrupção da gravidez às 39 semanas, nas gestações complicadas por PH idiopático.
Por Alexandra Matias | Professora Catedrática de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto; Assistente Graduada de Ginecologia e Obstetrícia e Medicina Fetal
Uma em cada quatro gestações termina em perda gestacional precoce. Metade das perdas gestacionais são causadas por aneuploidia fetal, mas a avaliação genética da perda gestacional não é realizada por rotina. A hibridização genómica comparativa por microarray (aCGH) do tecido da gravidez pode explicar a perda recorrente da gravidez, mas há dificuldade em recolher tecido gestacional, risco de contaminação com DNA materno e mosaicismo.
O DNA fetal livre de células (cffDNA) do sangue materno, com origem no trofoblasto fetal, tem potencial para avaliação não invasiva do estado de ploidia fetal, dado que a eliminação do cffDNA do sangue materno é mais lenta nos casos de perda gestacional.
Trata-se de um estudo prospetivo de coorte de 18 meses em que grávidas com perda gestacional das 5 às 22 semanas foram recrutadas pelo estudo Copenhagen Pregnancy Loss (COPL). O sangue materno foi colhido enquanto o tecido da gravidez ainda estava in situ até 24 horas, e foi analisado por cffDNA. A sequenciação direta do tecido da gravidez foi feita simultaneamente como referência.
Foram incluídas 1.000 mulheres consecutivas com perda gestacional. As primeiras 333 mulheres com perda gestacional serviram para avaliar a validade do teste. Os resultados das outras 667 mulheres foram incluídos para avaliar o desempenho do cffDNA. A sensibilidade do cffDNA na deteção de aneuploidia foi de 85% e a especificidade de 93%, em comparação com a sequenciação direta do tecido da gravidez: 45% euploides, 41% aneuploidias, 4% aneuploidias múltiplas e 11% inconclusivas.
O cffDNA mostra potencial e viabilidade para distinguir a perda da gravidez euplóide e aneuplóide, e melhorar a orientação clínica da futura gravidez.
As principais limitações são a janela de tempo estreita para amostragem de sangue para cffDNA e taxas mais altas de no call (50%) em amostras de sangue colhidas após o abortamento antes das 7 semanas.
Por Ana Isabel Machado | Assistente Hospitalar Graduada| Serviço de Obstetrícia do Centro Hospitalar Lisboa Central
A morte fetal in útero (MFU) após as 20 semanas encontra-se aumentada nas grávidas com diabetes (4- 5 vezes superior ao da população geral) e está relacionada com a hiperglicemia materna, que pode levar a anomalias congénitas, insuficiência placentária e hipoxia fetal.
Os autores neste estudo retrospetivo que incluiu 834631 grávidas, avaliaram o risco de a gravidez terminar em MFU em situações com diabetes prévia e gestacional entre as 34 e as 39 semanas; as gravidezes foram estratificadas de acordo com o peso ao nascer, classificado de acordo com a idade gestacional em leve, adequado ou grande. O RR e o IC para MFU foram calculados para cada semana de gravidez tendo como grupo controlo o com peso ao nascer adequado para idade gestacional.
As taxas de MFU aumentam com o avanço da idade gestacional para as grávidas com diabetes independentemente do peso ao nascer; contudo, comparando com as gestações com peso adequado no parto, os fetos leves e grandes para a idade apresentaram um aumento de risco significativo de MFU em qualquer idade gestacional.
Limitações: na variável diabetes prévia não distingue entre Diabetes tipo 1 e 2 e, nos casos de diabetes gestacional, o tipo de terapêutica realizada.
Em conclusão, este estudo sugere que o crescimento fetal patológico (restrição do crescimento fetal ou macrossomia) nas gestações complicadas por diabetes prévia ou gestacional é um fator de risco para MFU, particularmente nas situações de diabetes pré-gestacional e de fetos leves para a idade gestacional entre as 37 e as 38 semanas de gestação.
Estes resultados oferecem orientações adicionais para os profissionais de saúde sobre a frequência de vigilância, realização de exames complementares pré-natais e “timing” do parto nas gravidezes complicadas por diabetes, estratificada por peso ao nascer.
Por Inês Monteiro Rato | Assistente Hospitalar de Ginecologia-Obstetrícia / Hospital CUF Torres Vedras
Estima-se que a Pré-eclâmpsia (PE) afete 2-8% das gestações, sendo responsável por >70 000 mortes maternas e > 500 000 mortes fetais/ ano. A PE cursa com disfunção endotelial materna e placentária e pode associar-se a restrição de crescimento fetal (RCF), DPPNI, parto-pré-termo (PPT), e morte fetal (MF). Não existindo cura, o rastreio diagnóstico e monitorização da doença são importantes para a implementação de medidas preventivas.
Nas gestações com placentação anómala ocorre remodelação insuficiente das artérias espiraladas e consequente isquémia placentária. O balanço entre factores antiangiogénicos (sFlt-1) e pró-angiogénicos (PlGF) encontra-se alterada o que contribui para as manifestações clínicas da PE e a alteração nas concentrações séricas destes fatores pode ser detetada antes do aparecimento das manifestações clínicas da doença.
Nesta revisão sistemática os autores sumarizam o que se conhece da performance da utilização dos marcadores séricos maternos PlGF, sFlt-1 e a razão sFlt-1/PlGF na prática clínica.
Como principais conclusões, mas não dispensando a leitura atenta do artigo escolhido para esta semana, destacam-se:
– Em gestações simples, no 1º trimestre, a combinação da determinação de PlGF com factores de risco clínicos e marcadores ecográficos aumenta a acuidade do rastreio de PE.
– O ratio sFlt-1/PlGF é 1) clinicamente útil na orientação clínica de grávidas com sintomas inespecíficos de PE já que tem um elevado valor preditivo negativo; 2) um bom marcador na predição de PE na gravidez gemelar (com diferentes cut-offs); 3) tem maior sensibilidade e especificidade para o diagnóstico de PE do que o uso de PlGF isolado mas 4) sendo útil na predição de RCF e de PPT, a sua associação com morte fetal não é clara.
– Uma vez estabelecido o diagnóstico de PE, a repetição dos doseamentos pode ajudar na monitorização da progressão da doença e na determinação do momento do parto.
Por Leonor Macedo de Bivar | Assistente Hospitalar de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital de Braga
A infeção por citomegalovírus (CMV) é a infeção congénita mais frequente, com prevalência estimada de 0,5 a 2% em recém-nascidos, e a principal causa infeciosa de atraso mental na infância e de surdez neurossensorial. No entanto, a maioria das sociedades científicas não recomenda o rastreio serológico pré-natal porque as implicações negativas da sua implementação (ansiedade e iatrogenia) superariam a possibilidade de evitar sequelas importantes. Recentemente, foi sugerido que a administração materna de valaciclovir diminui a transmissão vertical e a probabilidade de lesões fetais.
Este trabalho reúne a escassa evidência científica publicada, avaliando a segurança e eficácia da terapêutica pré-natal com valacilovir em grávidas com infeção por CMV.
Os resultados demonstram que o tratamento após seroconversão materna é seguro e se associa a diminuição significativa do risco de infeção congénita (odds ratio (OR) 0.37 (95% CI, 0.21–0.64), p< 0.001) e aumento da probabilidade de infeção assintomática, sendo maior o benefício quando a terapêutica é administrada após infeção adquirida no primeiro trimestre de gravidez. No entanto, não foi possível aferir se a terapêutica melhora o prognóstico dos fetos com infeção já estabelecida.
De salientar, como principais limitações desta revisão, o reduzido número de casos e a natureza retrospetiva de alguns estudos incluídos, a falta de critérios para avaliação pré e pós-natal da infeção por CMV e a heterogeneidade na idade gestacional em que ocorreu seroconversão
Portanto, torna-se premente a discussão sobre a implementação do rastreio universal desta infeção e a realização de mais estudos que permitam clarificar o impacto do tratamento em fases mais avançadas da gravidez e perante a presença de lesões fetais associadas à infeção.
Por Fátima Palma | Assistente Hospitalar Graduada de Ginecologia Obstetrícia CHULC -MAC; Assistente convidada Faculdade de Ciências Médicas- Nova Medical School; Presidente Sociedade Portuguesa de Contraceção
O parto pré-termo (PPT) continua a ser a causa mais importante de mortalidade e morbilidade perinatal e uma das principais causas de morte antes dos 5 anos de vida. A predição e prevenção do PTT são uma das prioridades na investigacão atual. Atualmente a medição do colo uterino (das 18- 24 semanas) é o metodo mais eficaz de predição do PPT.
Também sabemos que o uso de progesterona vaginal é eficaz na redução do risco de parto prétermo nas grávidas com colo curto com ou sem história anterior de parto prétermo. A maioria dos estudos de predição do PPT contemplam apenas avaliações do colo até às 24 semanas de gravidez.
Neste artigo os autores fizeram um estudo de coorte retrospectivo (N=374 ) em grávidas com ameaça de parto pretermo e colo uterino ≤ 25mm depois das 24 semanas de gravidez. Os principais objetivos foram: avaliar a eficácia da administração de progesterona vaginal em gravidas com ameaça de parto prétermo e colo curto (≤ 25mm) e o número de internamentos na unidade de cuidados intensivos neonatais (UCINN). No grupo que fez progesterona houve uma redução estatisticamente significativa do parto espontaneo antes das 37 semanas (HR 0,50, 95%CI 0,28-0,73, p=0,001) e do numero de admissões de recem nascidos na UCINN(p=0,04) .
Como pontos fortes deste estudo: o numero de grávidas envolvido e a escolha criteriosa dos critérios de inclusão e de exclusão; como pontos fracos : o estudo ser retrospectivo o que criar algum vies na seleção das grávidas e a ausencia de critérios clinicos para decisão de utilizar ou não progesterona; no entanto as grávidas que fizeram progesterona apesar de terem os colos mais curtos, histórias de PPT anterioriores e idades gestacionais mais precoces no diagnóstico foram as que obtiveram melhores resultados. Os autores sugerem a realização de ensaios randomizados para confirmação destes resultados.
Por Joana Félix | Assistente Hospitalar de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Pedro Hispano; Assistente convidada da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.
O parto pré-termo (PPT) é a principal causa de morbi-mortalidade perinatal. Pelo seu elevado impacto socioeconómico, a redução da prevalência da prematuridade é um Millennium Development Goals das Nações Unidas.
O estudo apresentado é um estudo coorte prospetivo, com o objetivo de avaliar o impacto da implementação do rastreio do comprimento cervical na prevalência de PPT. Foi, assim, dividido em duas fases: antes da promoção do rastreio do comprimento cervical (coorte A) e após promoção do rastreio (coorte B). O outcome primário do estudo foi comparar a prevalência de PPT nas duas coortes.
Foram incluídas 336603 gestações unifetais, cujo parto ocorreu após as 24 semanas em 17 maternidades Francesas. A coorte A incluiu 171079 grávidas(parto entre 2012 e 2014) e a coorte B incluiu 165524 grávidas (parto entre 1 de maio de 2015 a 30 de abril de 2018).Entre as duas fases do estudo, foram desenvolvidas ações de promoção e sensibilização para a medição do comprimento cervical na ecografia do 2º trimestre, sendo que a realização deste rastreio aumentou de 28.9% na coorte A para 52.9% na coorte B. A prevalência de grávidas com colo curto a quem foi realizada intervenção (progesterona vaginal ou cerclage) também aumentou entre o período A (11.5%) e o período B (18%). Na coorte A ocorreram 9903 PPT (5.79%) vs. 9275 (5.6%) na coorte B, traduzindo uma redução estatisticamente significativa de 0.19% na taxa de prematuros. Estatisticamente, seria necessário rastrear 1250 grávidas para prevenir 1 prematuro.
Os resultados deste estudo demonstram que o rastreio do comprimento cervical se associa a uma redução de PPT, sendo que uma adesão superior à realização do rastreio poderia ter maior impacto na prevenção dos prematuros. Vários trabalhos têm obtido resultados semelhantes e estudos de custo-eficácia concluem que mesmo uma pequena redução da prevalência de PPT é custo-efetiva.
Por Fernando Jorge Costa | Assistente Hospitalar Graduado de Obstetrícia. Coordenador médico do setor de urgência, bloco operatório e formação específica de Obstetrícia A- CHUC.
O presente artigo aborda as consequências do número de cesarianas anteriores na complexidade técnica da cesariana futura e explora a possibilidade da ecografia protocolada atuar como preditor do risco e auxiliar de gestão cirúrgica. A cesariana é a intervenção cirúrgica major mais executada a nível mundial, aumentando, desde 2018, quase 1% ao ano.
A cesariana pode ser complexa, particularmente quando a placenta é anterior e/ou oclusiva. O risco maior é o de hemorragia massiva. Face ao aumento significativo da taxa de cesariana e da relação entre o número de cesarianas anteriores com placenta prévia e PAS, é previsível a ascensão numérica das cesarianas tecnicamente exigentes.
Antecedentes de várias cesarianas aumentam a hipótese de resultarem “nichos” de cesarianas de grandes dimensões com subsequentes riscos de gravidez ectópica na cicatriz de cesariana, deiscência do segmento inferior, rutura uterina, placenta baixa ou prévia e acretismo. Os autores reconsideram a fisiopatologia do acretismo placentário e sublinham a importância da preparação técnica da equipa cirúrgica, anexando apoio iconográfico.
A avaliação ecográfica pré-operatória imediata tem sido sugerida para determinar com precisão a localização placentária bem como o local ideal da histerotomia. Não existem normas ecográficas de avaliação do risco cirúrgico em doentes com antecedentes de várias cesarianas, além do contexto do PAS, tal como não existem para a avaliação do “remodeling” do segmento inferior ou aderências pélvicas. Estes são os objetivos do presente trabalho, colaborando na gestão da preparação cirúrgica.
É importante a confrontação entre os dados ecográficos pré-natais e os achados intraoperatórios. A complexidade técnica cirúrgica potencial exige uma preparação diferenciada. Neste texto é proposto um protocolo ecográfico e uma classificação do nível de dificuldade cirúrgica na futura cesariana.